Sempre tive o dom de imaginar coisas inimagináveis.
Espelho pra mim é televisão, caixa de papelão é ventilador,
ferro de passar roupa é cadeira, revista é sapateira. Baco é o deus da preguiça
e angústia é êxtase.
Crio a partir do irreconhecível, desenvolvo a partir do que
não evolui. O fato de me apaixonar por qualquer puta insossa confirma a
hipótese.
Eros é invisível. Contemplo o feio e insulto o belo.
Rasga-verbo é carta de amor, loucura e desconforto é o sinal
verde pra paixão.
O que aparentemente encaixa não dá liga, e o que deveria
confirmar acaba por desfocar.
Coração vira arco-e-flecha, fantasia é realidade.
Horrorizo a sanidade, a racionalidade e a certeza.
Solidariedade é auto-promoção, patriarcado é consumo.
Os significantes possuem opostos significados.
Abrigo a clareza e aceito o insulto, tão belo quanto chupar
boceta.
Cravar um canivete na mão amiga é sinal de afeto.
Não fui porra, não fui zigoto. Nasci a partir do desgaste,
da insistência e do sofrimento. Nasci da pele preta de quem dança, da lombriga
da criança, da sujeira resistente debaixo das unhas das mãos belas de um
pianista. Sou afta, que arde e incomoda, mas que se tem orgulho e mostra.
Cresci na ponta de ridículo do espetáculo, sou a farpa que
penetra o best-seller.
Sou a reconstrução da humanidade, com alma de viciada.
E em toda a certeza que eu sou, o vômito do trago, eu cuspo
na minha própria cara e me repudio.
Bruna Léo
03/10/2013
Nenhum comentário:
Postar um comentário