sexta-feira, 18 de outubro de 2013

Sempre tive o dom de imaginar coisas inimagináveis.
Espelho pra mim é televisão, caixa de papelão é ventilador, ferro de passar roupa é cadeira, revista é sapateira. Baco é o deus da preguiça e angústia é êxtase.
Crio a partir do irreconhecível, desenvolvo a partir do que não evolui. O fato de me apaixonar por qualquer puta insossa confirma a hipótese.
Eros é invisível. Contemplo o feio e insulto o belo.
Rasga-verbo é carta de amor, loucura e desconforto é o sinal verde pra paixão.
O que aparentemente encaixa não dá liga, e o que deveria confirmar acaba por desfocar.
Coração vira arco-e-flecha, fantasia é realidade.
Horrorizo a sanidade, a racionalidade e a certeza.
Solidariedade é auto-promoção, patriarcado é consumo.
Os significantes possuem opostos significados.
Abrigo a clareza e aceito o insulto, tão belo quanto chupar boceta.
Cravar um canivete na mão amiga é sinal de afeto.
Não fui porra, não fui zigoto. Nasci a partir do desgaste, da insistência e do sofrimento. Nasci da pele preta de quem dança, da lombriga da criança, da sujeira resistente debaixo das unhas das mãos belas de um pianista. Sou afta, que arde e incomoda, mas que se tem orgulho e mostra.
Cresci na ponta de ridículo do espetáculo, sou a farpa que penetra o best-seller.
Sou a reconstrução da humanidade, com alma de viciada.
E em toda a certeza que eu sou, o vômito do trago, eu cuspo na minha própria cara e me repudio.

Bruna Léo

03/10/2013

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